20 de julho, 2016
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paivanunes
1.INTRODUÇÃO
O testamento configura-se como um ato solene e revogável, vez que, a qualquer tempo, em vida, o testador poderá revogar ou mesmo retificar as suas disposições de ultima vontade. O ato de testar é revestido de solenidade. No universo jurídico brasileiro, a solenidade do ato de testar diz respeito precipuamente às formalidades legais. Assim, é necessário que o ato de testar cumpra as determinações previstas em lei, sob pena de incorrer em nulidade.
O testamento, além de ato solene, é considerado como um negócio jurídico unilateral e personalíssimo. Entende-se por personalíssimo, devido ao fato do conteúdo das disposições do testamento, só poderem ser feitas pelo testamenteiro e mais ninguém, nem mesmo por meio de um procurador ou representante. A lei permite que um terceiro auxilie o testamenteiro, desde que esta pessoa não tenha participado das disposições testamentárias, ou seja, desde que quem auxiliou o testador não figure como beneficiária do testamento.
A unilateralidade do testamento se dá pelo fato dele produzir efeitos apenas com a assinatura do testador, ou seja, apenas pela vontade de um lado do negócio jurídico, independente da manifestação dos herdeiros testamentários. O simples fato de herdeiro renunciar ao seu quinhão hereditário não descaracteriza a unilateralidade do testamento. Por este motivo, o testamento não é considerado um contrato, pois ele independe da vontade de duas partes.
Ainda, como objeto de estudo corolário ao testamento, encontramos o instituto jurídico do inventário extrajudicial, conhecido ordeiramente como “inventário em cartório”. A grande busca por esta modalidade de inventário está baseada na ideia de que tal instituto não encontra qualquer demora vez que, a princípio, prima pela celeridade e economia, pois a escritura poderá ser concluída em poucos dias. Contudo, salientamos que para que o inventário extrajudicial seja realizado em cartório, os herdeiros devem necessariamente ser maiores, capazes e não pode haver divergências entre os herdeiros. Ou seja, o procedimento deve ser consensual.
O presente artigo tem como estudo focalizado o testamento no que se refere aos efeitos jurídicos da sua abertura extrajudicial. Tendo por finalidade analisar e formular uma proposta para abertura extrajudicial do testamento baseado no consentimento dos herdeiros. No presente trabalho são apresentados e analisados os principais pontos conceituais e elementos constitutivos a cerca do testamento.
O testamento é conceituado, sobretudo, como negócio jurídico unilateral embasado na autonomia da vontade. Utilizado como parâmetro procedimental, o inventário extrajudicial é estudado no presente trabalho sob a perspectiva de dois pontos: os aspectos dos limites de admissibilidade e os aspectos dos limites de regulamentação.
Por sua vez, se faz necessário estudar ainda o testamento cerrado, modalidade de testamento que visa tão somente garantir o sigilo da expressão de vontade do testador. Nesta modalidade de testamento, ninguém toma conhecimento da última vontade do testador. Nem mesmo as testemunhas, vez que só participam do ato de aprovação do testamento. O tabelião, nesse tipo de testamento, limita-se apenas a declarar a autenticidade da expressão de vontade. O testamento cerrado é ainda conhecido como testamento secreto ou místico. Tal modalidade de testamento é a mais procurada, pois possibilita a discrição do conteúdo valendo-se de total autenticidade[1].
Por fim, abordamos os efeitos jurídicos da abertura extrajudicial do testamento, analisando os institutos de restrição e ampliação do tema em destaque, com enfoque na autonomia da vontade dos herdeiros, formulando a proposta de estudo dos efeitos jurídicos da abertura extrajudicial do testamento, lastreando os argumentos favoráveis com base na celeridade e economia processual, bem como alicerçando na autonomia da vontade dos herdeiros, a possibilidade da abertura extrajudicial do testamento.
2. DO TESTAMENTO
2.1 – Definição, conceito e elementos constitutivos
O testamento é o meio utilizado pelo testamentário para dispor de sua ultima vontade. O testamento figura como o meio mais apropriado para efetivar o exercício da liberdade de testar, sendo igualmente conhecido como declaração de ultima vontade[2]. A sucessão post mortem opera-se no contexto jurídico brasileiro através da declaração de ultima vontade[3]. O ato de disposição de ultima vontade pode ser auxiliado por um terceiro, por exemplo um advogado, desde que não influa sobre a vontade do testamenteiro. O testamenteiro pode se dirigir a um cartório, na presença de um tabelião e testemunhas, e formalizar a sua expressão de ultima vontade.
O princípio da autonomia da vontade é o principal fundamento para dar alicerce ao poder de testar[4]. Por isso é possível afirmar que o testamento é um negócio jurídico utilizado para legitimar a ultima expressão de vontade do testador. O artigo 1.858[5] do Código Civil estabelece que o testamento é um ato personalíssimo, fato que o torna modificável a qualquer tempo. Assim, o testamento é um ato que pode ser revogado a qualquer tempo pelo testador, pois o testamento ainda que exista e seja válido, o mesmo não chegou a produzir os seus efeitos.[6] Assim, temos que o testamento é um negócio jurídico, de caráter personalíssimo, revestido de formalidade, que pode ser revogável, e que tem como primordial objetivo a destinação dos bens do testador.
O testamento é uma típica manifestação de vontade. Assim, essa manifestação de vontade se destina a produção de efeitos, o que atribui ao testamento, como dito anteriormente, o status de negócio jurídico, com efeito, mortis causa. Os efeitos jurídicos do testamento ficam suspensos até que ocorra evento futuro e indeterminado no tempo, ou seja, a morte do testamenteiro.[7]
Tal negócio jurídico se perfaz mediante a simples vontade do testador, não dependendo do momento em que a manifestação de vontade foi expressa, ou mesmo o intervalo de tempo entre a manifestação de vontade e sua plena eficácia, pois, definitivamente, o que será levado em consideração para o mundo jurídico é tão somente a expressão de vontade do testador.[8]
A sucessão testamentária é uma sucessão legítima, porém, não é corriqueira. A utilização do testamento está ligada a fatores socioeconômicos e a fatores geralmente estranhos ao direito. O ato de testar lembra a morte, implicando, às vezes, em óbice, em decorrência de fatores emocionais, psicológicos e familiares.
Além desses fatores, “o excesso de solenidade do testamento, com o risco sempre latente de o ato poder sofrer ataques de anulação após a morte” acaba afastando as pessoas da possibilidade de exercer a sua vontade expressa em testamento.[9] O testamento deve adaptar-se ao fato social, a família, e a propriedade. Com o advento do novo Código Civil, no ano de 2002, houve a facilitação da elaboração do testamento, diminuindo-se as formalidades, podendo assim proteger a autonomia da vontade do testamentário[10].
Encontram-se submersos no mundo ético princípios que são sustentáculos da liberdade de dispor do patrimônio pessoal, assim como, preservam os elos de solidariedade, firmando limitações ao direito de testar. A sucessão post mortem se opera através da declaração de ultima vontade, a qual devem seguir os critérios legais. A não realização do testamento implica na concordância tácita aos ditames previstos em lei[11].
As regulamentações legais dos institutos jurídicos reafirmam-se perante a sociedade que as cria e utiliza cada vez mais em suas necessidades socioeconômicas, tendo em vista o aumento destas, transformando a vivência humana. O progresso alimentado por essas necessidades não pode parar. O direito, que nasce da sociedade, deve caminhar com o seu desenvolver, tendo em vista que a sociedade dinamiza e transforma o direito[12].
A autonomia da vontade é o princípio que fundamenta o poder de testar. O ato de realizar a expressão de ultima vontade através do testamento não faz parte da cultura brasileira. Em regra, a realização do testamento é sempre deixada para depois, posto ser o testamento algo que está associado à convalescência.[13] Sílvio Venosa, por sua vez, vem a confirmar a presença da autonomia da vontade do testamento, conforme podemos observar nesta passagem:
[…] o testamento é um dos pontos mais relevantes do direito privado, pois é nele que se revela com maior amplitude da autonomia da vontade privada[14].
Logo, o testador, ao diligenciar no preparo de seu testamento está exercendo sua autonomia da vontade. Os efeitos jurídicos decorrem da utilização da autonomia da vontade. Conclui-se, portanto, que a expressão de vontade nada mais é que um negócio jurídico[15].
2.2 – Da capacidade de testar
Existe uma capacidade especial para se proceder com o ato de testar. Capacidade que não deve ser confundida com a capacidade geral para exercer os atos da vida civil. Ao regular de forma diferente a aptidão para determinados atos, a lei a bem da verdade, aborda o tema da legitimação para o ato.
A legislação impõe limites para exercer o ato de testar. Não são todas as pessoas que podem exercer a expressão de ultima vontade. Em regra, apenas as pessoas físicas podem exercer o ato de testar. No que tange às pessoas jurídicas, existem outras formas de dispor do seu patrimônio quando ocorre o seu desaparecimento. No entanto, tanto as pessoas jurídicas e as pessoas físicas, podem receber por testamento[16].
Afirma-se que a capacidade de testar é a regra, bem como a incapacidade de testar é a exceção. Desta forma, quem por ventura suscitar a incapacidade testamentária ativa, necessariamente, possuirá o ônus de provar o alegado. Estando no pleno gozo de suas faculdades mentais, apenas as pessoas físicas possuem capacidade para testar. O ato de testar requer capacidade de fato.
Assim, como bem dito anteriormente, o ato de testar é personalíssimo, sendo vedada, inclusive, a representação do incapaz, exigindo-se apenas como idade limite os dezesseis anos completos. A capacidade de testar deve ser notória. Tal pressuposto é inerente às pessoas físicas, que devem estar em pleno gozo de suas capacidades mentais no momento em que estiverem emitindo a expressão de vontade. Assim, em razão do testamento ser um ato personalíssimo, concluiu-se que o incapaz não pode ser representado para exercício de expressão de ultima vontade[17].
As pessoas que são reconhecidas como civilmente capazes podem emitir a sua declaração de ultima vontade. Porém, no que tange à legitimidade para testar, o Código Civil determina como sendo a idade mínima para exercer o direito de testar, dezesseis anos completos. Assim, qualquer pessoa que não seja considerada absolutamente incapaz e que já possua dezesseis anos completos, não necessita da assistência dos pais ou de eventual tutor para expressar a sua vontade em testamento. Percebe-se que não estamos falando de eventual redução da capacidade de exercício de direito, ou mesmo de específica capacidade civil, mas apenas de legitimidade para o exercício de direito que é outorgado em lei[18].
De relevância expor que a aferição da capacidade ou mesmo da legitimidade do testador somente se dará no momento da realização do testamento. Ou seja, o que importa para o mundo jurídico é saber se quando o testador manifestou a sua vontade, possuía o necessário discernimento para realizar a sua expressão de ultima vontade. Assim, a eventual capacidade superveniente não invalida o testamento[19].
Cabe mencionar que o Código Civil apenas estabelece um limite mínimo de idade para a realização da expressão de ultima vontade, não havendo assim, qualquer tipo de restrição ou incapacidade relativa à idade avançada. No caso da idade avançada, caso exista algum tipo de enfermidade que prejudique o total discernimento, o testador será considerado incapaz de testar em razão da enfermidade e não por consequência de sua idade[20].
3. DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL
3.1 – Definição, conceito e elementos constitutivos
O inventário extrajudicial é uma modalidade simplificada de inventário. A Lei nº 4.442, de 2007, faculta aos herdeiros optar pela realização do inventário e a patilha mediante uma única escritura pública, sendo tal escritura lavrada por notário de livre escolha dos herdeiros. Registra-se que a citada lei determina que os herdeiros devem ser legítimos, capazes e que estejam concordes. A legislação não impõe restrição ao herdeiro único que opte por utilizar o inventário extrajudicial, decorrendo na adjudicação de todos os bens que foram deixados pelo de cujos[21].
Por se tratar de um procedimento mais célere, o inventário extrajudicial produz seus efeitos no momento em que o tabelião promove a lavratura da escritura pública de testamento. Assim, o traslado que é extraído da escritura pública, consiste em hábil que se promova a averbação do registro dos imóveis – caso existam –, bem como para que seja possível certificar a aquisição da titularidade de eventuais bens, na exata forma como se procedeu à partilha, perante qualquer órgão publico ou privado, ou mesmo perante qualquer pessoa jurídica ou física. Para que a escritura pública seja lavrada, é necessário que se proceda com o recolhimento de tributos que incidem no montante da herança[22].
3.2 – Limite de admissibilidade
A legislação impõe, necessariamente, a assistência do advogado para a realização do inventario extrajudicial. A assistência imposta pela lei não se caracteriza como a simples presença formal ao ato visando apenas a sua autenticação. O advogado deve assessorar de forma participativa e promovendo a orientação peculiar de sua profissão, esclarecendo dúvidas e elaborando a minuta para a lavratura da escritura pública[23].
Na escritura deve constar a qualificação do advogado e o número de inscrição no quadro da OAB. Caso os herdeiros não possuam condições de contratar um advogado, poderão ser assistidos por um defensor público. Além da gratuidade da assistência jurídica, a legislação prevê que os declaradamente pobres perante o tabelião, não poderão pagar os emolumentos que seriam devidos ao tabelionato. Isso decorre do fato que a atividade notarial é serviço público que é delegado pelo Poder Judiciário, ainda que seja exercida de forma privada, a prestação pode ser gratuita como bem determina a lei[24].
Além da qualificação do advogado, a escritura pública deve conter a qualificação do de cujos, qual era o regime de bens, qual foi a data do falecimento, qual foi o lugar do falecimento, qual a data que a certidão de óbito foi expedida e onde foi registrada, deve constar ainda a declaração dos herdeiros de que o de cujos não deixou testamento e outros herdeiros. Ainda, necessariamente, deverão os herdeiros apresentarem as certidões comprobatórias de titularidade bens móveis e imóveis. Caso detenham apenas a posse dos bens, os herdeiros deverão repassar todas as informações necessárias que possam identificar os bens[25].
3.3 – Regulamentação. Da resolução nº 35/2007 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ.
Impede destacar que todos os interessados na sucessão do de cujos, o que não se restringe apenas aos herdeiros, poderão participar do inventário extrajudicial. Em razão disso, ao lado dos herdeiros, irão participar do inventário extrajudicial os cessionários de direitos hereditários de qualquer um dos herdeiros[26].
A resolução nº 35/2007 do CNJ exige ainda, o comparecimento dos companheiros e dos cônjuges de todos os herdeiros, no caso de renúncia ou de qualquer ato que enseje em transmissão. A exceção surgira quando os cônjuges ou companheiros forem vinculados ao regime de separação total de bens. Acaso algum dos herdeiros não reconheça a existência de união estável, o inventário necessariamente deverá ser judicializado[27].
4. DO TESTAMENTO CERRADO
4.1 – Definição, conceito e elementos constitutivos
O testamento cerrado contém este nome visto que visa garantir o sigilo da vontade do testador. Em regra, esta modalidade de testamento é escolhida por quem deseja manter as suas disposições de ultima vontade em segredo. Possui formalidades mais amplas, fato que atribui maior segurança ao ato. Na modalidade cerrada, o testamento apenas poderá ser elaborado e subscrito pelo testador, através instrumento particular, de cunho pessoal e sigiloso[28].
Registra-se que o testamento cerrado não é modalidade de testamento público, vez que o disponente não declara a sua vontade expressamente ao tabelião, pois o tabelião apenas valida o ato[29]. Na modalidade cerrada de testamento, o tabelião só tem conhecimento do conteúdo do testamento caso o testador escolha o tabelião para que o mesmo lavre o instrumento, vedando-o e lacrando-o no final. Ou seja, o tabelião se limita apenas a declarar a autenticidade do testamento.
O testamento cerrado só ingressará no mundo após a aprovação do tabelião. Enquanto não houver o auto de aprovação, o testamento cerrado não pode ser considerado um ato jurídico perfeito. Temos que a segurança da modalidade de testamento cerrado é inferior se comparada ao testamento público, tudo em razão do sigilo de seu conteúdo. Assim, acaso o testamento cerrado venha a ser extraviado, o termo de aprovação lavrado pelo notário não será suficiente para exarar uma certidão do seu conteúdo, diferentemente do que ocorro com o testamento público[30]. Ou seja, o tabelião apenas poderá garantir a autenticidade do testamento cerrado no caso do seu extravio, contudo, não poderá declarar nada em relação ao seu conteúdo.[31].
É imposto pela legislação, mais especificamente pelo Código Civil em seu artigo 1.872, que o testamento cerrado só poderá ser realizado por aquele que saiba ler [32]. O impedimento legal imposto às pessoas que não enxergam para expressão de ultima vontade mediante testamento cerrado visa tão somente protege-los de eventuais fraudes.
Porém, é possível que aquele que não enxerga, mas consegue escrever utilizando da linguagem em braile, tenha a sua expressão de vontade tida como válida e eficaz[33]. A legislação não impede que aquele que não saiba ler possa se valer do testamento cerrado, vez que poderá ouvir o que foi escrito por uma pessoa de sua confiança, autenticando secundariamente a origem do seu testamento mediante o auto de aprovação notarial[34].
Não existem formalidades legais exigidas para que o testador possa utilizar-se do testamento cerrado, formalidades estas que não dizem respeito ao conteúdo ou forma. O testamento cerrado, a partir do advento do Código Civil de 2002, pode ser reproduzido de forma mecânica ou eletrônica. Dispensa-se a forma manuscrita por parte do testador, porém este deverá numerar e autenticar todas as folhas que forem reproduzidas ou impressas seja com a sua assinatura ou sua rubrica[35].
Acaso o testamento seja feito a rogo deverá conter obrigatoriamente a assinatura de quem o escreveu. Não existe a obrigatoriedade de se conter data, vez que autenticação conterá a data, sendo esta data considerada para verificar a competência do tabelionado de notas, bem como a capacidade do testador, ou até mesmo a anterioridade de outro testamento. O testamento cerrado pode ser apresentado em idioma nacional ou estrangeiro, desde que a língua estrangeira seja familiar ao testador e, na ocasião da abertura do testamento, a tradução será realizada[36].
Deverá o testador realizar a entrega do seu testamento ao tabelião, declarando na ocasião que aquele é o seu testamento, requerendo a sua aprovação, devendo a referida entrega ser realizada na presença de duas testemunhas. Registra-se que o ato de entrega é personalíssimo, não sendo possível a realização da entrega ocorrer mediante procurador ou mesmo mandatário. O tabelião deverá confeccionar o instrumento de aprovação no final do testamento. O termo de aprovação tem três partes: primeira é a introdução que qualifica as partes, localidade e a data, segunda é a confirmação que recebeu o testamento para a autenticidade deste e, por fim, a terceira, que é o encerramento com leitura e a assinatura do instrumento.
Na ocasião da morte do testador, o testamento só poderá ser aberto pelo magistrado na presença de quem o apresentou, bem como do escrivão. É de grande importância verificar a integridade da cédula testamentária. Após a abertura é realizada a leitura do auto de aprovação, sendo lavrado termo circunstanciado no qual deverá conter a informação de que o testamento foi entregue ao magistrado. Após, sendo apurada a inexistência de eventuais vícios, é realizada a ouvida do Ministério Público. Após tais formalidades, o magistrado determina o cumprimento do testamento[37].
5. DA ABERTURA EXTRAJUDICIAL DO TESTAMENTO
5.1 – Da revogação do testamento cerrado.
O testamento cerrado poderá ser revogado ou mesmo receber cláusulas adicionais, desde que seja realizado outro ato negocial, devendo ser observada a mesma forma do anterior ou ainda qualquer outra forma. No que tange à revogação do testamento cerrado, o artigo 1.972 do Código Civil, normatiza que quando o testador, ou alguém com o seu consentimento, vier dilacerar ou violar o instrumento de última vontade, o testamento será considerado como revogado[38].
Vejamos o que estabelece o artigo 1.972 do Código Civil:
“Art. 1.972. O testamento cerrado que o testador abrir ou dilacerar, ou for aberto ou dilacerado com seu consentimento, haver-se-á como revogado.”.
Porém, caso o testador tenha dilacerado ou aberto o testamento de forma acidental, há entendimento doutrinário no sentido de ser considerado como vigente o testamento, vez que a revogação apenas seria operada se a ação fosse intencional[39].
5.2 – Da responsabilidade do tabelião – Lei nº 8.935/1994.
Com relação à disposição testamentária, nota-se que o Código Civil é omisso quanto à responsabilidade dos tabeliães em razão de possíveis falhas ou omissões, isso em relação aos testamentos que eventualmente tenha oficiado.
No entanto, o artigo 22 da Lei nº 8.935/1994 – Lei dos Notários e dos Registros Públicos prevê de forma genérica a responsabilidade dos notários e oficiais de registro, tudo em relação aos eventuais danos causados a terceiros, em razão de conduta sua ou de seus prepostos. Ademais, o artigo 23 da referida lei, assevera que a responsabilidade civil do tabelião independerá da responsabilidade criminal.
5.3 – Do aproveitamento do negócio jurídico como testamento particular.
Diante da morte do testador, o testamento deverá ser apresentado à justiça, visando reproduzir os efeitos jurídicos que foram objeto da última expressão de vontade do testador. Deverá o juiz proceder com a abertura do testamento na ocasião da sua apresentação, determinando ao escrivão que se proceda com a leitura do mesmo, sendo necessária a presença daquele que levou o testamento a juízo. Assim, recomenda-se que o juiz designe audiência especial, realizando a devida intimação ao menos do inventariante, bem como do Ministério Público[40].
Na ocasião da abertura do testamento é lavrado um ato, que deverá ser assinado por aquele que apresentou o testamento em juízo e rubricado pelo magistrado que presidiu a audiência. O Ministério Público é instado a se manifestar, em não havendo qualquer vício que enseje em nulidade ou aduza a falsidade do testamento, o magistrado determina o registro, arquivamento e cumprimento do testamento. Registra-se que o procedimento citado no parágrafo anterior não veda a propositura de eventual ação de invalidade, que pode ser movida por interessados que suscitem eventuais vícios intrínsecos ou extrínsecos. Ou seja, vícios de conteúdo e de forma[41].
Porém, o Código Civil não prevê a hipótese do testamento não atender aos requisitos extrínsecos, requisito extremamente necessário à modalidade do testamento cerrado. Porém, nesse sentido, o Código Civil satisfez às exigências legais no que tange ao testamento particular, aproveitando, por oportuno, o negócio jurídico correspondente.
Faz-se necessário destacar que o silêncio do legislador quanto ao instituto do testamento cerrado, não deve ser entendido como uma vedação legal, vez que o próprio Código Civil, em seu artigo 170, abarca a teoria da conversão substancial do negócio jurídico, teoria amplamente aplica aos institutos de Direito Privado.
Vejamos o que bem assevera o artigo 170:
“Art. 170. Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade.”.
No que tange ao testamento cerrado, os requisitos relativos ao termo de aprovação visam tão somente trazer a garantia da autenticidade do negócio jurídico, bem como de trazer a definição de sua data. Em decorrência disso, eventual irregularidade irá comprometer a garantia jurídica, inviabilizando a validade do testamento. Porém, acaso o ato reúna os elementos essências ao testamento privado, o valor da segurança jurídica do ato ensejará no aproveitamento da declaração de última vontade. Registra-se que não estamos falando de uma conversão do negócio jurídico nulo, vez que o negócio jurídico nulo não produz qualquer efeito, ressalvando os casos de putatividade[42].
5.4 – Da possibilidade da abertura extrajudicial do testamento com o consentimento dos herdeiros
O Código Civil prevê em seu artigo 1.972, a hipótese do testador ou uma terceira pessoa sem sua autorização, promover a abertura do testamento cerrado ou inutilizá-lo materialmente. O Código Civil prevê, por consequência, a absoluta presunção de revogação. A revogação abarca diversas possibilidades, entre as quais, a simples abertura do testamento cerrado, ou mesmo destruição do testamento por qualquer processo físico ou químico ou ainda lançando-o ao mar ou em uma floresta[43].
A proposta de estudo do tema em destaque, a abertura extrajudicial do testamento com o consentimento de todos os herdeiros, esbarra nas hipóteses legais que implicam na revogação do testamento, seja ele publico ou particular. A rigor, como bem determina a lei, a simples abertura do testamento cerrado, implica em sua revogação.
O testamento é ato solene de deve ser protegido evitando qualquer tipo de violação. O legislador visou tão somente tutelar o valor da segurança jurídica. Assim, o beneficiário de um testamento que venha a ser destruído, poderá requerer em juízo, que seja aberta a sucessão, devendo provar que a intenção do testador era beneficiá-lo, e que a destruição do testamento se deu por motivos alheios a vontade do testador. Registra-se que aquele que destrói, oculta ou suprime, qualquer tipo de documento, seja ele público ou privado, visando benefício pessoal ou de terceiro, ou ainda o prejuízo alheio, deverá incorrer nas penas do artigo 305 do Código Penal[44].
Quanto ao rompimento do testamento, necessário dizer que o rompimento é a desconstituição de testamento válido, em razão de hipóteses previstas no Código Civil. A revogação não deriva diretamente da vontade do testador. Porém, o testador pode contribuir para o evento do rompimento do testamento, a exemplo, adotando um filho após emissão de expressão de ultima vontade. Para que o rompimento seja descaracterizado, não se faz necessário que o testador a parcela legítima dos seus herdeiros necessários, vez que a tutela de tais herdeiros será realizada com a dedução das disposições testamentárias[45].
Ademias convém salientar, lastreado no entendimento da legislação brasileira vigente, que se torna inviável homologar judicialmente a partilha efetuada extrajudicialmente, isto quando for necessária a abertura de inventário judicial, em razão da existência de disposição de última vontade, ou seja, em razão da existência de testamento.
O Código de Processo Civil, em seu artigo 982, dispõe que havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário.
Da leitura do artigo supra transcrito, é possível chegar a duas conclusões. A primeira, é que em havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial. Já a segunda, em havendo testamento, e efetuado o registro, o inventário será judicial, mas a partilha de bens poderá ser feita por instrumento público e deverá ser homologada judicialmente.
6. CONCLUSÃO
Ao longo do estudo do tema proposto, observamos que o testamento é tido como um ato solene e revogável, alicerçado na autonomia da vontade. Assim, a pessoa que expressa sua ultima vontade através do testamento pode, a qualquer tempo, em vida, revogar ou retificar o testamento. Necessariamente, no universo jurídico brasileiro, precisa o testamento ser revestido de solenidade, ou seja, devem-se respeitar as formalidades legais, sob pena de nulidade.
Demonstrou-se que o testamento é considerado como um negócio jurídico unilateral e personalíssimo. A unilateralidade do testamento se dá pelo fato de produzir efeitos apenas com a assinatura do testador, ou seja, apenas pela vontade de um lado do negócio jurídico, independente da manifestação dos herdeiros testamentários.
Posteriormente fora estudado o inventário extrajudicial, onde se visou demonstrar que tal modalidade de inventário está baseada na ideia de que o instituto não encontra qualquer burocracia, vez que, a princípio, prima pela celeridade e economia. No entanto, conforme preconiza a lei, salientamos que para que o inventário extrajudicial seja realizado em cartório, os herdeiros devem necessariamente ser maiores, capazes e não pode haver divergências entre os herdeiros, existindo notadamente o consenso entre as partes.
Analisamos o testamento cerrado, modalidade de testamento mais sigilosa se comparada ao testamento público, pois o conteúdo do testamento cerrado só será conhecido após a morte do testador. Porém, para que o testamento cerrado tenha validade, é necessário que o mesmo seja aprovado por um tabelião. Caso não exista aprovação do tabelião, o testamento cerrado não será reconhecido como um ato jurídico perfeito.
Diante de toda a análise contextual, chegamos ao entendimento de que não se configura como juridicamente possível, ainda que com o consentimento de todos os herdeiros, proceder com a abertura extrajudicial do testamento. A lei determina que, em havendo testamento, a sua abertura será realizada apenas judicialmente, sob pena do ato de torná-lo nulo.
FONTE: Jus Navegandi
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